O Vademecum publicado pela Santa Sé a propósito do Sínodo iniciado pelo Papa Francisco em outubro passado no Vaticano, apresenta alertas concretos para os trabalhos a desenvolver. Em particular, sinalizando tentações, autênticas “armadilhas que é preciso evitar, para promover a vitalidade e a fecundidade do Processo Sinodal” – pode-se ler no texto. Publicamos aqui na íntegra:

  • A tentação de querermos ser o guia de nós mesmos em vez de nos deixarmos guiar por Deus. A sinodalidade não é um exercício estratégico corporativo. É, antes, um processo espiritual conduzido pelo Espírito Santo. Podemos sentir a tentação de esquecermos a nossa identidade de peregrinos e servos no caminho que Deus traçou para nós. Os nossos humildes esforços de organização e coordenação estão ao serviço de Deus que nos guia pelo caminho. Somos barro nas mãos do divino oleiro (Is 64,8).
  • A tentação de nos concentrarmos em nós próprios e nas nossas preocupações imediatas. O Processo Sinodal é uma oportunidade para nos abrirmos, para olharmos à nossa volta, para vermos as coisas a partir de outros pontos de vista e para sairmos em perspetiva missionária em direção às periferias. Isto implica que pensemos a longo prazo. Significa também alargar as nossas perspetivas à escala da dimensão de toda a Igreja e questionar-nos: Qual o projeto de Deus para a Igreja aqui e agora? Como podemos implementar o sonho de Deus para a Igreja a nível local?
  • A tentação de ver apenas “problemas”. Os desafios, as dificuldades e as complicações que o nosso mundo e a nossa Igreja enfrentam são muitos. No entanto, fixar-nos apenas nos problemas é um caminho com uma única saída: sentir-nos esmagados, desencorajados e cínicos. Se nos concentrarmos apenas na escuridão, podemos deixar de ver a luz. Em vez de nos concentrarmos apenas no que não está a correr bem, vamos apreciar os lugares onde o Espírito Santo já está a gerar vida e ver como podemos deixar que Deus trabalhe mais plenamente.
  • A tentação de nos concentrarmos apenas nas estruturas. O Processo Sinodal exigirá naturalmente uma renovação das estruturas a vários níveis da Igreja, a fim de fomentar uma comunhão mais profunda, uma participação mais plena, e uma missão mais frutuosa. Ao mesmo tempo, a experiência da sinodalidade não devia concentrar-se antes de mais nas estruturas, mas na experiência de caminhar juntos para discernir o caminho a seguir, inspirados pelo Espírito Santo. A conversão e a renovação das estruturas só serão possíveis através da conversão e renovação permanentes de todos os membros do Corpo de Cristo.
  • A tentação de um olhar que não ultrapassa os limites visíveis da Igreja. Dando expressão ao Evangelho nas nossas vidas, as leigas e os leigos atuam como fermento no mundo em que vivemos e trabalhamos. Um Processo Sinodal é um tempo de diálogo com pessoas do mundo da economia e da ciência, da política e da cultura, das artes e do desporto, dos meios de comunicação e das iniciativas sociais. Será um tempo para refletir sobre a ecologia e a paz, sobre várias questões da vida e sobre as migrações. É preciso ter horizontes bem alargados com o objetivo de cumprirmos a nossa missão no mundo. O Processo Sinodal é também uma oportunidade para aprofundar o caminho ecuménico com as outras confissões cristãs, bem como o nosso diálogo com outras tradições de fé.
  • A tentação de perder de vista os objetivos do Processo Sinodal. À medida que avançamos no itinerário do Sínodo, temos de ter cuidado para que, apesar da abrangência das nossas discussões, o Processo Sinodal mantenha o objetivo de discernir a forma como Deus nos chama a caminhar juntos. Nenhum Processo Sinodal vai resolver todas as nossas preocupações e problemas. A sinodalidade é uma atitude e uma abordagem que permitem um progresso corresponsável e aberto a acolher juntos os frutos de Deus ao longo do tempo.
  • A tentação do conflito e da divisão. “Que todos sejam um só” (Jo 17,21). Esta é a oração ardente de Jesus ao Pai, pedindo a unidade entre os seus discípulos. O Espírito Santo leva-nos mais profundamente à comunhão com Deus e uns com os outros. As sementes da divisão não dão frutos. É inútil tentar impor as nossas ideias a todo o Corpo através da pressão ou desacreditar quem sente as coisas de maneira diferente de nós.
  • A tentação de tratar o Sínodo como uma espécie de parlamento. Isto confunde a sinodalidade com uma “batalha política” em que, para governar, um lado tem de derrotar o outro. Antagonizar os outros ou encorajar conflitos divisionistas, que ameaçam a unidade e comunhão da Igreja, é contrário ao espírito de sinodalidade.
  • A tentação de escutar apenas aqueles que já estão envolvidos nas atividades da Igreja. Esta pode ser a abordagem mais fácil de gerir, mas acaba por ignorar uma proporção significativa do Povo de Deus.

O Sínodo de 2023 tem como tema “Por uma Igreja Sinodal: Comunhão, Participação e Missão” e encontra-se agora na sua fase de consulta diocesana. Uma primeira fase que se concluirá em agosto de 2022, à qual se seguirá uma segunda fase continental que preparará a Assembleia dos bispos em outubro de 2023.

RS